CRIANÇAS SINCERAS, SERÃO ADULTOS DESBOCADOS?

Esta pergunta surge na sequência de vários acontecimentos, mas principalmente por causa de uma conversa com uma amiga.

Há pessoas, adultas e conscientes do que dizem, que são desbocadas. Não têm um filtro entre a sua mente e a sua boca, e portanto tudo o que pensam, dizem. Sem olhar a educação, a respeito, a nada. Pensou, disse. O pior, é que quem diz o que quer, ouve o que não quer. 

E foi o que aconteceu com a filha desta minha amiga. É uma adolescente que como todos os adolescentes, julga-se a voz da razão. Diz o que lhe vem à cabeça e defende esse seu jeito, com a desculpa de ser uma pessoa sincera e frontal. Portanto, se tem a dizer algo a alguém, di-lo na cara. Mas lá está, quem diz o que quer, ouve o que não quer. 

Há uns dias, a rapariga fez um dos seus comentários fantásticos a alguém, e esse alguém respondeu-lhe à letra. Resultado, a miúda amuou e a mãe ficou muito ofendida com a pessoa, já que segundo ela, a miúda é miúda, logo é normal dizer as coisas sem pensar e a outra pessoa, já é mais velha, logo tem de saber separar as coisas e não responder na mesma moeda.

Por um lado, até é verdade, mas por outro, ninguém é obrigado a levar com a má educação de um adolescente com a mania que sabe tudo. A senhora podia estar num dia mau e disse o que a miúda não queria ouvir.

A minha questão à minha amiga, foi se ela no lugar da outra senhora, não teria a mesma reação. Porque eu sou sincera, também sou pouco tolerante com certos comentários. Mas a minha amiga diz que nunca teria aquela reação, até porque a miúda sempre foi assim. "Desde pequenita" - contava-me ela - "uma vez fomos a casa de uns colegas do meu marido e ela disse que a casa cheirava mal. A mulher ficou com ar de chateada, mas não disse nada..." - E eu perguntei - E tu? O que fizeste? - "Nada." - responde-me ela - "Mas se tivesse um buraco, tinha-me lá enfiado."

Conversa vai, conversa vem, perguntei-lhe com que idade a miúda fez aquele comentário, pensado eu, que teria sido aos 3 ou 4 anos. Mas não. Foi aos 7 ou 8. 

Bem, nesse caso, a minha opinião altera-se um pouco. Uma criança de 7 ou 8 anos já anda na escola, já lê, já escreve, já distingue o que é correto ou não, o que magoa, o que ofende, logo já percebe que há coisas que por muito verdadeiras que sejam, não se devem dizer. Nomeadamente que a casa de alguém cheira mal, ou que está desarrumada, ou que é velha, ou o que seja, principalmente quando essa pessoa não é alguém das nossas vivências. 

Parece-me a mim, que os pais também têm um papel na frontalidade e sinceridade das crianças. Que tal explicar que não se devem fazer certos comentários? De certeza que a criança se for avisada umas quantas vezes começa a perceber que não o deve fazer. E assim, essa criança chegará a adulta com essa capacidade inata de ter um filtro entre a mente e a boca. Evitando assim ouvir coisas que também não gostará de ouvir.

Há uns tempos a avó de outra amiga, contava-nos um episódio com uma vizinha cusca e sem filtro. A senhora chega-se ao pé da avó da minha amiga e diz: "Ai mulher, estás tão gorda. Olha para essa barriga... ai, estás mesmo gorda..."
A avó da minha amiga, que não é de ouvir e calar responde-lhe: "Olha, já tu estás feia. É que estás mesmo feia."
Foi remédio santo. Mas o mais engraçado disto, é que quando a avó da minha amiga contava o episódio, a vizinha estava presente. E pronto, teve que ouvir, enfiar a carapuça e calar. 
Porque quem diz o que quer, ouve o que não quer.